20/08/2011

A moça do Herbalife

Essa é mais uma das histórias que eu pretendo contar tem uns bons meses, e só hoje eu adquiri a coragem / ânimo pra unir todos os retalhos do fato armazenados em um arquivo .txt e transformar o ocorrido em um conto em formato de texto. Vamos aos fatos, de antemão (porra, é legal usar essa palavra) eu peço desculpas porque provavelmente não vou lembrar de tudo que se passou naquele dia.

Bom, era uma segunda feira. Estávamos todos animados pelo fato de ter onze horas de aula em um só dia, e na hora do almoço (interprete como "período de uma hora entre aulas para que não morramos [nota do autor: essa palavra realmente existe, mas é estranha pra caralh...ok, foda-se] de fome") eu e mais um grupo de especificamente 5 broders saímos pra comer um bom espaguete no restaurante mais visitado pelo pessoal bacana. Ok, é uma espelunca que vende macarrão barato. Mas isso não vem ao caso.

Abro um parêntese para citar que no nosso colégio TEM almoço, mas isso não quer necessariamente dizer que é algo comestível. Além de reciclar a comida, como rondam os boatos, lá é proporcionalmente caro pra cacete. E NÃO VENDE COCA COLA. Deixo aqui minha real indignação.

Voltemos à história.

Não me lembro muito bem dos detalhes do restaurante, mas sei que comemos o suficiente pra encontrar dificuldade em subir o morro de no máximo 20º no caminho até a escola. Eis que na metade do trajeto somos surpreendidos por uma mulher que desesperadamente gritou "MENINO VEM CÁ! Ô MENINO!" na nossa direção, praticamente pulando na nossa frente. Ela era baixa, loira, uns 40 e poucos anos e meio... roliça. Enfim, ela parou a gente no caminho e começou a fazer umas perguntas:

"Vocês já almoçaram? Comeram o quê no almoço? Sabia que tem um jeito saudável de almoçar sem engordar e ainda podendo ganhar massa muscular? Afinal, hoje em dia você tem problema com isso. Todo mundo tem problema!"

Entregou pra cada um de nós um pequeno panfleto que dizia "Convite Pessoal". Mais tarde vou explicar por que ainda tenho o meu, que está aqui em minhas mãos. Seria um prazer scanear e colocar aqui pra enriquecer o pobre texto, mas como meu scanner fez o favor de quebrar e eu estou muito à toa agora, eis uma cópia dele que eu acabei de fazer no Paint:


Figura 1: seta vermelha indica a gororoba 1, seta azul indica a gororoba 2. Explicarei também mais tarde. Ao fundo da imagem, potinhos de comprimido. Fiquei com preguiça de desenhar.

Sempre me emociono com minhas habilidades no paint. Enfim, esse papel encontrava os seguintes dizeres na parte de trás:

"FAÇA ESTA NUTRIÇÃO INTELIGENTE!

Ganhe:
+ Energia
+ Vitalidade
+ Saúde
+ Controle de Peso com os benefícios de uma vida saudável
+ Ganho de Massa Muscular


Elimine:
- Excesso de Peso
- Gordura Localizada
- Stress
- Cansaço Físico e Mental
"

Abaixo, "Distribuidor Independente" com telefone e endereço da parada, além do nome da mulher. Chamemos-na de R, mantendo o anonimato.

Ela continuou seu discurso de "o que mais interessa pro adolescente é ganhar massa muscular", o que ela sabia porque tinha um filho de nossa idade. Claro que tinha. Enquanto isso olhávamos para o panfleto, enquanto pensávamos em consenso "essa merda não pode substituir um almoço" olhando pra foto da gororoba 2, em destaque. A mulher insistia para que visitássemos a nova loja - que ela se recusava a chamar de outra coisa além de "espaço de convivência". Negamos, afirmando que tínhamos acabado de almoçar, a aula era dali a meia hora, etc. Ela compreendeu e pediu (insistiu) para que aparecêssemos por lá no dia seguinte. Consentimos (pensando 'não') e fomos embora. Nisso perdemos uns 5 minutos, ela parecia inteiramente focada em nos levar pra lá naquele momento, ignorando os outro transeuntes que passavam pela rua. Um grupo de 5 potenciais clientes realmente lhe parecia bem aparente.

Seguimos nosso caminho, relembrando o fato (leia-se rindo pra caralho) de como a moça estava desesperada pra que a gente fosse lá tomar o que ela havia chamado de "Shake saudável", que interpretamos como a gororoba 2.
Agora, pra explicar o motivo de termos voltado, você precisa interpretar o que se passa na cabeça de um presidiário aluno de terceiro ano que tem cinco horas de aula pela frente: qualquer coisa que envolva "passar um pouco mais de tempo fora da escola antes da aula" nos parece atraente, discutimos as possibilidades, afirmando que seria engraçado pra cacete ir lá ver que merda era aquela.

Assim, a seguir pelo lema "Tá no inferno, abraça o capeta", lascamos um "foda-se, é melhor que ir pra escola" e fomos ver do que se tratava.

Voltamos, tentando evitar a R, que se distraía contando o mesmo discurso para outro pedestre, enquanto entrávamos no prédio onde ficava a sala do "espaço de convivência". Na porta, um segurança exigiu nossa carteira de identidade pra passar pela catraca que dava acesso aos elevadores, recusando-se a nos deixar passar sob qualquer circunstância. Essa foi a primeira tragédia do dia: um dos broders estava sem a carteira de identidade, que estava na mochila a dois quarteirões de distância. Insistimos para que ele fosse lá buscar correndo, mas não dava tempo; com certo desapontamento nos separamos dele enquanto adentrávamos o prédio. [nota do autor: Ítalo, a ver por agora, acredito que você foi o único de nós que teve sorte, pois o que viria a acontecer nos próximos minutos seria muito constrangedor. Mas cê devia ter ido buscar a identidade, cacete.]

Já dentro do prédio, esperamos o elevador por um bom tempo. Tempo esse que foi suficiente para que déssemos a sorte de encontrar com uma pessoa a dois segundos de a porta se fechar: A R. Ela entrou no elevador, dizendo
"Ó MENINOS VIERAM EXPERIMENTAR O NOSSO SHAKE, HEIN?" enquanto pensávamos coletivamente: "que merda".

Vamos ao fato: não sei por que maldito motivo um elevador é um lugar que nos faz rir quando estamos com amigos e tem um desconhecido por perto. Acho que é a comum falta de assunto e o sislêncio constrangedor, enquanto olhamos um pra cara do outro. Agora multiplique as risadas por dez, já que o desconhecido em questão era a própria R. A porra da sala era no DÉCIMO QUINTO andar, e a mulher falava que nem uma infeliz sobre as vantagens do produto dela, o quanto ele era melhor que uma barra de cereais e etc. Eu segurava o riso com força descomunal, enquanto o Rafinha e o Raphão riam pra caralho, e olhar pra ele me fazia rir também. O Mike, o único que conseguiu se manter sério, prestava atenção nas maravilhas do shake que a R citava, enquanto nós tentávamos nos controlar.

Depois de um período que pareceu constrangedoramente maior do que foi na verdade, chegamos ao andar da loja - quer dizer, do espaço de convivência - que ao abir da porta se mostrou nada mais que uma salinha branca com uma janela, um banheiro, algumas cadeirinhas de plástico, cartazes e uma outra salinha que aparentava servir como cozinha, como você vê no detalhado mapa abaixo.


Figura 2: Abaixo a entrada, setas vermelhas são os cartazes, verde a janela; quadrados azuis são as cadeiras; a bola roxa é a R e os X somos nós, enquanto ela discursava para nós.

Ao entrar da sala, percebemos de instante o que aquilo era: Herbalife. Estrategicamente o "convite pessoal" não indica em lugar nenhum o nome da marca, provavelmente para não alertar as pessoas sobre as quinze mil reclamações diárias sobre os produtos enganosos. A mulher apontou para o cartaz de maior destaque, que mostrava fotos "antes/depois" de pessoas que compraram o produto e emagreceram, ficaram fortes, bonitas e inteligentes. Ela nos mostrou a foto de um sujeito de terno, com pose de milionário. E contou:

"Esse é o X. Ele é o fundador da nossa marca, e tem uma história de vida muito bonita. Ele perdeu a mãe, que morreu tragicamente com uma overdose de anabolizantes. Por isso, ele foi pra China conhecer os tratamentos feitos com ervas medicinais e hoje é o magnata dos produtos para perda de peso no mundo."

Agora, caro leitor, pense comigo. O cara perdeu a mãe. Por isso, ele pensou "VOU PARA A CHINA TRABALHAR COM A PERDA DE PESO!" Hoje ele é milionário. Encontre a ligação entre os fatos dessa história, porque pra mim não faz merda de sentido nenhum.

Aí ela começou a mostrar cada foto do cartaz, contando a história de cada pessoa: "Essa é a Y. Ela é mãe de sei lá quantas crianças, e essa era ela antes do nosso Shake. Essa é ela hoje" dizia a R, enquanto apontava para a foto de uma mulher que passou de uma rolha de poço para um palito saudável.

Nesse tempo todo pensávamos: "querida R, se o seu Shake é tão maravilhoso, por que você não usa?" Afinal, ela aparentava estar tão saudável quanto uma picanha frita.

Ela continuava seu discurso, agora nos mostrando como uma pessoa trabalhava como sei lá o quê, ficou milionária sendo um revendedor do Shake-maravilha e agora não precisa trabalhar mais, pois tem empregados que revendem o Shake dele. "Esse aqui é o W. Começou há dois anos a vender os nossos produtos e hoje é milionário, ganha 10 (ou 20, não lembro direito) mil por mês."

Agora vamos às contas: pra ser milionário, você precisa ter pelo menos um milhão (obrigado, sr. óbvio). Vamos por aí que o cara ganha uma média de 15 mil por mês. Me acompanhe, abra sua calculadora do Windows:

1 milhão divido por 15 mil/ mês = 1 000 000 / 15 000 = 66,7 meses. Dois anos têm 24 meses. O cara realmente deve ser um gênio. O Raphão, outro broder, percebeu a matemática do caso e olhou pra mim, se esforçando pra segurar o riso e prestar atenção na bela história que a R contava.

E o cara parecia ser um conhecido do Mike, nosso broder. A moça recomendou "Ó, depois você pergunta pra ele pra você ver como ele é rico." Realmente.

Terminada a história de cada felizardo que melhorou sua vida milagrosamente, passando pelo "gordo que não tinha amigos", a "adolescente bulímica", o "bastardo que encontrou o Senhor" e outros casos, a mulher disse: "Agora eu vou preparar o chá para vocês. Ele serve para melhorar a concentração, deixar atento, etc e o caralho a 4. Me dêem seus convites pessoais".

Ela entrou na cozinha (a sala à direita na Figura 2), trouxe 4 copos e pediu os nossos nomes. Por que diabos ela queria isso? Pegou uma caneta e anotou um em cada copo. Voltou à cozinha e encheu os copos (que, por sinal, eram daqueles grandes, de 700 ml) da gororoba 2, como visto na Figura 1. Acontece que na Figura 1 a gororoba 2 não parecia com um copo de óleo misturado com água como era na realidade, só que um pouco mais escuro. Ela encheu os quatro copos até a boca e entregou cada um para o respectivo dono, de acordo com os nomes. Olhamos praquele líquido e pensamos "puta merda" enquanto ela falava que o filho dela também era um problema porque adorava hambúrgueres e não comia comida saudável, e sei lá o quê.

Então ela disse que ia até a cozinha preparar o tal Shake, que era a parte 2 do processo. Assim que ela saiu nos entreolhamos e discutimos qual seria a saída para não tomar aquela merda, que era completamente intragável. O Rafinha, um dos meus broders, analisou as opções e concluiu que a gente podia ou jogar a parada na privada ou pela janela, enquanto a mulher não olhava. Mas como uma opção mais sensata chamamos a R e argumentamos que tínhamos que voltar para a escola por causa da hora, enquanto almejávamos jogar o líquido na primeira sarjeta que encontrássemos pelo caminho. Entretanto ela disse, enquanto voltava a preparar a gororoba 1: "Ok, acabem seus chás e amanhã vocês tomam o Shake, porque não pode sair com o copo daqui". Espaço de convivência o caralho, então. A privada e a janela pareciam muito mais atraentes agora.

Nos entreolhávamos sem conseguir parar de rir e pensando na melhor maneira de ir embora dali o mais rápido possível. A R apareceu na sala de novo e olhou para nós e os copos, em sua maioria intactos, e acho que nessa hora ela percebeu que a gente não estava ali como clientes em potencial. Novamente ouviu de nós que realmente precisávamos ir embora, e que a gente voltaria outro dia. Acreditando nessa informação com um pouco da infeliz esperança que ela possuía, nos devolveu nossos convites pessoais e recolheu os copos, afirmando que esperaria por nós no dia seguinte. Agradecemos e saímos da sala, a tempo de ela ouvir a explosão de risadas (acho que de alívio por ter saído dali, principalmente) que soltamos assim que pisamos fora do "espaço de convivência", em direção ao elevador. Planejamos até levar a galera no lugar no dia seguinte, mas por motivos divinos essa ideia foi rejeitada mais tarde.

Fomos pra escola contar os fatos para o pessoal, e nesse dia eu prometi que um dia imortalizaria essa história aqui no blog. Check. Espero que tenham se deleitado, caros leitores, porque foi engraçado pra caralho.

Moral da história: Não sejam fracassados na vida. Sério, e almocem direitinho, com as 7 cores do prato. Façam isso pelo tio Cash, e comentem aqui no blog. Eu sempre fico feliz com seus comentários.

See you soon, bros.

2 comentários:

  1. cara, foi muito foda esse dia! huahuhauhaua ri pra caralho da R... essa historia mereceu ser imortalizada!! MENINÔ, VEM CA!

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